Racionalismo X Empirismo:


Razão e experiência:
Tratemos da relação entre razão e fatos empíricos. Duas correntes na epistemologia (campo da filosofia que estuda o conhecimento) por muito tempo discutiram qual o meio mais seguro de conhecer as coisas. O racionalismo e o empirismo. De acordo com os racionalistas, a principal fonte de conhecimento era a razão. Descartes, o fundador da filosofia moderna, era um racionalista. Ele viveu no tempo de Galileu, onde as velhas verdades estavam sendo contestadas. Ele queria encontrar um ponto, uma certeza inicial, que fosse confiável, pelo qual ele poderia construir o edifício de sua teoria. Ele pôs em duvida a realidade externa. Colocou também em duvida os raciocínios matemáticos. Poderia haver um gênio maligno, pondo em nossa mente pensamentos falsos, produzindo nela ilusões. Mas de uma coisa não podemos duvidar: da nossa própria existência enquanto ser pensante. Para duvidar é preciso existir. Tem que haver algo que emite essa dúvida. Disso ele encontra uma verdade axiomática, o cogito: penso, logo existo. A partir disso ele construiu toda sua filosofia, comprovando depois a existência de Deus, da realidade externa, das verdades matemáticas, etc.
De outro lado, temos os empiristas como Locke e Hume, que acreditavam que a experiência era a fonte do conhecimento. A razão estaria sujeita a experiência. Será que poderíamos, por exemplo, saber das verdades matemáticas sem ter as noções dadas pela experiência de quantidade e de forma? Immanuel Kant, um filosofo que viveu no auge do iluminismo, propôs uma terceira alternativa, que conciliava razão e experiência, que foi chamada criticismo, considerava a revolução copernicana na filosofia. Kant tem uma longe fase, chamada de fase pré-crítica, onde imperou no seu pensamento um racionalismo dogmático, muito influenciado pela escola de Leibniz-Wolff. Depois, sobretudo com a leitura de David Hume, influenciado pelo seu ceticismo, acabou por despertar do que ele mesmo chamou de sono metafísico, tomando uma direção com diferente em suas investigações e compreendendo os limites da razão. Para ele tanto o racionalismo quanto o empirismo tinham aspecto de verdade. São necessárias duas categorias de conhecimento: os fatos conhecidos a priori e a posteriori. A priori são fatos que conhecemos apenas através da reflexão, do raciocínio lógico dedutivo, como por exemplo as verdades matemáticas.
Os fatos a posteriori são aqueles onde é necessário o uso dos sentidos, como as teorias científicas. Desse modo, era preciso uma síntese entre o conhecimento a priori e a posteriori. Os conhecimentos que nos chegam através da experiência são organizados pela razão para formar um todo coerente. Há outras divisões em Kant. Há a diferença entre juízo analítico e o juízo sintético. Conhecimento analítico é aquele baseado na linguagem e nos significados das palavras. Por exemplo: um quadrado redondo não existe. A verdade dessa sentença depende apenas dos significados das palavras quadrado e redondo. O conhecimento sintético é aquele que não está contido no significado das palavras. Por exemplo a sentença: todo cisne é branco. O fato do cisne ser branco não está contido no significado da palavra cisne. Com isso, chegamos a três tipos de juízos: Juízo analítico a priori é aquele que o predicado já está contido no sujeito. Por exemplo: o triângulo tem três lados. O predicado nesse caso não acrescenta em nada ao conhecimento, apenas explica o sujeito. Juízo sintético a posteriori: é o tipo de juízo que acrescenta algo que não está oculto no sujeito e que depende da experiência. Por exemplo: Sócrates é grego. Temos no predicado uma informação nova. Juízo sintético a priori: é aquele cujo predicado não está contido sujeito, mas que advém da razão, da reflexão. Não poderia haver um juízo analítico a posteriori, dado que que todo conhecimento que já esteja contido no significado das palavras não requer experimentação. Todo conhecimento analítico é a priori. Então podemos dizer simplesmente: conhecimento analítico, dado que analítico a priori seria um redundância.

Contudo, para Kant, só poderíamos apreender o fenômeno do objeto que estamos estudando, ou seja, a forma pelo qual ele se apresenta para nós. O númeno, a coisa como ela é em si, seria para nós inacessível. Podemos usar esses conhecimentos da epistemologia para entender melhor como Kardec via a relação da razão com a experiência na construção da doutrina espírita. Kardec, na conclusão de O Livro dos Espíritos, item VI, reconhece a importância da razão como uma força que sustenta a doutrina:
“Falsíssima idéia formaria do Espiritismo quem julgasse que a sua força lhe vem da prática das manifestações materiais e que, portanto, obstando-se a tais manifestações, se lhe terá minado a base. Sua força está na sua filosofia, no apelo que dirige à razão, ao bom-senso.”
Mesmo que não houvesse as manifestações mediúnicas, mesmo que a teoria espírita fosse imaginada pela mente de alguém, a doutrina teria sua força na lógica, na solução de problemas filosóficas que nenhuma filosofia até então conseguia resolver:
“Declaram então que, mesmo quando estes fenômenos não existissem, ainda ficava uma filosofia que só ela resolve problemas até hoje insolúveis; que só ela apresenta a teoria mais racional do passado do homem e do seu futuro. Ora, como é natural, preferem eles uma doutrina que explica, às que não explicam, ou explicam mal.” FONTE: O Livro dos Médiuns, item 32.
Contudo, Kardec deixa claro que a teoria espírita, diferente das outras que foram propostas para explicar os fenômenos mediúnicos em sua época, não foi produto da imaginação humana, de ideias preconcebidas, mas foram os próprios Espíritos quem revelaram sua natureza, afirmando serem a alma dos homens que viveram na Terra ou em outros mundos:
“Não estabeleceu nenhuma teoria preconcebida; assim, não apresentou como hipóteses a existência e a intervenção dos Espíritos, nem o perispírito, nem a reencarnação, nem qualquer dos princípios da doutrina; concluiu pela existência dos Espíritos, quando essa existência ressaltou evidente da observação dos fatos, procedendo de igual maneira quanto aos outros princípios.” FONTE: A Gênese capitulo 1, item 14

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